A FORÇA DO FUTEBOL

Há expressões recorrentes na gíria futebolística: “Chuta com o pé que tem mais à mão.”; “Não tem pé esquerdo.”; “O pé direito é cego” … Estas e outras metáforas preenchem o relato / comentário de qualquer partida de futebol.
Algures, em África, mais propriamente na Serra Leoa, expressões como as que citei poderão, objectivamente, expressar o que se desenrola numa disputa entre formações compostas por mutilados.
O semanário Courrier Internacional, de 9 de Junho, editou um suplemento dedicado ao Mundial 2006. Uma das temáticas abordadas é a de futebolistas amputados. Robin Dixon do Jornal Los AngelesTimes diz-nos o seguinte: “Os praticantes têm só um pé, mas muita esperança.”
O continente africano, ao longo de décadas, tem assistido à chacina dos seus habitantes. As guerras deflagram, em diversos pontos, e matam milhares de pessoas. Os genocídios não são raros. Quem não recorda guerras fratricidas entre Angolanos, Moçambicanos ou o genocídio ocorrido no Ruanda. Na hodiernidade, a grande problemática centra-se no Sudão. Guerra, fome, doença, subnutrição adjectivam, inequivocamente, os estados africanos. Quando a paz é alcançada pelas partes, subsiste um problema gravíssimo: a existência de milhares de minas no subsolo. Elas estão por todo o lado, os campos estão minados e provocam um contingente infindável de mutilados.
Na Serra Leoa, alguns apaixonados pelo desporto-rei fintaram a adversidade de não poderem contar com um dos membros inferiores. Criou-se o Clube Desportivo dos Mutilados (CDM). Actualmente, existem 80 praticantes e 3 equipas. O futebol é o elemento impulsionador destas vidas destroçadas pelos conflitos.
As frases que se seguem ilustram os sentimentos que impregnam estes homens:
- “Éramos poucos para formar uma equipa. Poucos com coragem suficiente para tentar chutar na bola.”
- “Foi muito duro.”
- “Quando as dores eram muito fortes, punha-me a chorar e implorava: ‘Que Deus me leve!.´ mas agora percebo que deus queria que eu fosse alguém e foi por isso que não atendeu os meus pedidos”.
- “Voltei a ter coragem.”
- “A alegria que sinto quando chuto uma bola é mais importante do que a que sentia quando jogava com as duas pernas.”
A crença em Deus e o amor ao futebol permitem que sonhem. A felicidade foi reencontrada. O futebol, mais do que um desporto, funciona como uma terapia física e psicológica. O ópio do povo é o futebol, não restam dúvidas.

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