Mundial: de indivíduos com milhões para milhões de indivíduos…

O futebol é considerado, por uma vasta franja populacional, como sendo o desporto do povo. Os exemplos, da paixão exacerbada das massas, surgem ao virar da esquina. A 1.ª sessão de trabalho aberta aos adeptos, na Alemanha, levou 12 000 pessoas às bancadas do estádio Gutersloch. O Sr. Romão Barbosa percorreu 2221km de Guimarães até Marienfeld para entregar as bandeiras de Portugal e do Brasil a Fernando Meira (seu conterrâneo) e a Scolari respectivamente. O Sr. Padre Manuel compôs um hino, dedicado ao mister, ao qual Toy emprestou a sua voz. A histeria, loucura, emoção e paixão dos adeptos portugueses, espalhados um pouco por todo o mundo, não será, certamente, distinta da experimentada pelos fãs de outras equipas. O futebol é um desporto com milhões de adeptos que “vestem a camisola, o boné e o cachecol”; entoam cânticos, vão ao estádio, fazem tudo para dar força ao clube e selecção que AMAM!!! Muitos são os que gastam o que têm e o que não têm para adquirir ingressos, acompanhar os ídolos… Para além da subida da adrenalina e do convívio com os amigos, o retorno, na maioria das situações é residual, salvo se os seus eleitos vencerem e preencherem o seu coração de alegria e energia para dar e vender.

Este futebol, acompanhado por milhões, tem recheado os cofres de alguns clones do tio mais famoso do mundo: o Tio Patinhas. O Tio Sam que me perdoe. Pondere-se o exemplo paradigmático da equipa liderada por Mourinho. Dinheiro parece não ser problema para o magnata Russo. O Chelsea já contratou Shevchenko (50 milhões) e John Obi Mikel (23 milhões). Instado a comentar os valores das transações, Mourinho afirma que os passes estão inflacionados mas recorda que “o dinheiro é dele” e que o seu clube é “gerido por uma fortuna”. O poder aquisitivo está concentrado num número restrito de magnatas que aplicam o seu dinheiro angariado em negócios, por vezes, pouco cristalinos! O jogo do povo, melhor, que o povo financia, possibilita a angariação de fortunas pessoais e de algumas empresas. Vejamos, com a realização do Mundial a FIFA arrecadará 258 milhões de euros. O campeonato fora do rectângulo de jogo é extremamente competitivo. As marcas apostam fortemente, tendo em vista retornos financeiros avassaladores: Philips (31,3 milhões de euros; McDonald`s 29,3 milhões de euros). As marcas digladiam-se por um espaço vantajoso (adidas, Avaya, Anheuser-busch Budweiser, Coca-cola, Continental, Deutsche Telekom…) Há jogadores valiosíssimos que movimentam verbas avultadas em publicidade: Ronaldinho / Trident e Beckam / Gillette são bons exemplos. Milhões … mais milhões … E nós???

Eu, como a maioria dos leitores, terei que assistir aos jogos pela TV. O futebol há muito que deixou de ser o desporto do povo, a cada dia que passa torna-se mais elitista. Quem poderá comprar um bilhete de avião (ida e volta), pagar hotel e comprar bilhetes a preços astronómicos para os jogos? Quem terá a possibilidade de “gozar férias” neste ou noutro período do ano? Quem terá a felicidade de poder assistir ao jogo da nossa selecção que se realiza ao início da tarde de um dos dias de trabalho? De facto alguns ganham milhões às custas da paixão de milhões… os Tios Patinhas andam por aí… A transmissão dos jogos da equipa portuguesa em sinal aberto deixam-me mais tranquilo. Desta vez, não precisarei de assitir aos encontos no café da esquina ou incomodar amigos que gentilmente me convidam para o seu lar! Poderei juntar as pessoas de quem gosto na mimha humilde casa, ligar a Tv e assistir, tranquilamente, aos feitos gloriosos do ilustre povo lusitano.